Produção Nacional: Comerciantes geram lucros altos com a venda de ananás nos mercados
O trajecto da senhora Victória Ngueve, 39 anos, que vende frutas dentro de um camião no mercado do trinta, há pelo menos 14 anos, começa às 5 horas da manhã.
Victória Ngueve deixa marido e três filhos, em Benguela, e percorre mais de 500 kilometros até Luanda , com um camião fretado carregado de ananás. Sete horas depois, Victoria Ngueve estaciona no mercado do trinta e só abandona o recinto quando a mercadoria acaba. Uma jornada que varia de três a cinco dias.
O camião carregado de frutas com um investimento que ronda os 300 mil kwanzas, a comerciante compra em Benguela dez ananáses a 500 kwanzas.
No mercado do trinta ela comercializa aos preços de 100, 200, 250 e 300 kwanzas, cada, "dependendo da qualidade". Feitas as contas, com um carregamento de mais ou menos 600 ananás e ao preço médio de 200 kwanzas, a vendedora pode conseguir 1.200 mil kwanzas.
Além dos gastos com alimentação e o pagamento de dois trabalhadores contratados para venda, Vitória Ngueve ainda paga o frete do camião a 250 mil kwanzas, que só sai dai depois termina a venda.
"É uma vida muito difícil, mas é daqui que sai o sustento dos meus filhos", lamenta a vendedora, que no momento da entrevista, fazia o pequeno almoço com uma "magoga" de fígado e uma caneca de chá de capungo pungo. Tudo comprado no recinto.
Com um semblante pacífico, próprio de quem já está acostumada á sua realidade, Vitória assume que o negócio é rentável, e com o que tira das vendas consegue sustentar os filhos, só lamenta das ausências constantes...
Batata rena
A comerciante, Ana Bela Diatela, começou a empreender há 16 anos , quando investiu o equivalente a dez mil kwanzas para comprar um saco de batata rena para vender aos montes. Depois de várias tentativas no negócio, hoje chega a vender mais de cinco sacos de 30 kilos, por dia.
Actualmente Ana Bela Diatela compra o tubérculo no Bié e no Huambo em grandes quantidades, " e neste último carregamento trouxe 100 sacos", declarou.
Sem especificar exactamente o valor da compra, Ana bela Diatela disse que paga para o frete cerca de 4 mil kwanzas por cada saco de 30 kilos, que comercializa na praça do trinta a 12 mil e quinhentos kwanzas.
No trinta, o seu produto pode ser ainda adquirido nas quantidades em caixa de 25 kilos (7 mil kwanzas) e balde de dez kilos a 1.500.
É um negócio rentável apesar dos sacrifícios. Consigo sustentar os meus filhos e tenho dois filhos no ensino superior, e nunca faltei com as propinas, Graças Deus"
Actualmente, Ana bela Diatela emprega trabalhadores fixos e outros extras que trabalham aos fins de semana para reforçar o serviço nos dias de maior movimento, para venda e descarga do produto.
Estradas esburacadas dificultam escoamento
Ao contrário dos países mais desenvolvidos, Angola é altamente dependente do transporte rodoviário de cargas.
O caminhão carregado de batata rena tenta "esquivar um buracão" na estrada de terra de mais de 680 quilómetros que liga Bié a Luanda. O veículo faz mal o desconto, volta de ré e tomba atravessado na pista estreita.
A solução é esperar a chegada de um mecânico para solucionar o problema. o trajecto que em condições normais duraria dois dias, acabou fazendo sete dias, relata a vendedora de batata rena, Ana Bela Diatela, que lamenta a perda de quase metade dos produtos que chegaram estragados. "É um prejuízo muito grande"
Essa vulnerabilidade no escoamento da safra no Bié foi igualmente levantada por Vitória Ngueve (Benguela) e outras tantas, como a vendedora Paula Sérgio, que compra laranjas na fronteira do Zaire.
Essas vias são responsáveis pelo transporte de mercadorias entre as províncias, da produção agrícola para os pontos de comercialização ou exportação, além de serem o acesso usado por milhares de cidadãos.
Cultivo e colheita
O ananás-comum (Ananas comosus) é uma herbácea da família das Bromeliaceae, originária do Brasil e Paraguai. Existem outras espécies de ananás, de fraco ou nulo valor e expressão comerciais. Ananás e abacaxi são nomes comuns para a mesma planta, da qual existem diversas variedades.
De acordo com o agrónomo Adérito Costa, Angola tem condições positivas para um processo de produção em larga escala, mas os constranginetos com os escoamento inibem o processo e "isso só será um facto quando houver maior consideração e consumo da produção nacional".
"Até hoje enquanto produtores sentimos algum desconforto em produzir em larga escala, quando ainda temos um mercado que não garante confiança no processo de escoamento e valorização da produção nacional", disse
Dentre outras espécies, o Cayenne, Cayenne lisse, Comosus var e Pérola são as mais produzidas,
Actualmente, o ananás é mais produzido nas províncias do Benguela, Huambo, Bengo, Zaire, Uíge, com maior predominância em Benguela e Bié.
O processo de produção obedece a necessidade do preparo do solo para o bom resultado da produção.
O ciclo de produção depende da idade da planta na qual é realizada a indução floral. Para os plantios tradicionais de sequeiro, é de aproximadamente 18 meses, ao passo que nos plantios irrigados esse ciclo pode ser reduzido para 14 a 15 meses.
O solo para a sua produção deve ser de textura média ou arenosa, bem drenados, de preferência planos ou com pouca declividade, profundidade do lençol freático superior a 90 cm e pH na faixa de 4,5 a 5,5. É uma cultura muito sensível ao encharcamento do solo, ou seja, em solo com dificuldade de permear a água de irrigação pode prejudicar o seu crescimento e produção. Solos argilosos também podem ser utilizados desde que apresentem boa aeração e drenagem das águas neles lançadas quer pelo sistema de rega humano, ou natural (as chuvas).
Por ser uma planta de clima tropical, apresentando crescimento óptimo e melhor qualidade do fruto na faixa de temperatura de 21 a 32 °C, sendo que temperaturas acima de 40°C e abaixo de 5°C causam distúrbios fisiológicos na planta. A planta é exigente em luz, necessitando de 2.500 a 3.000 horas de luz por ano, ou seja, de 6 a 8 horas de luz/dia e precisa de 1200 a 1500 mm de água ou chuvas bem distribuídas durante o ciclo de cultivo. Em locais com períodos secos prolongados, recomenda-se o uso de irrigação. A humidade do ar de 70 % ou superior é o ideal para a cultura. Em culturas de sequeiro, recomenda-se realizar o plantio no final do Cacimbo e início da época chuvosa. Nas culturas com sistema de irrigação, o plantio pode ser realizado durante todo o ano atendendo o mercado no período de entressafra, quando o produto é mais valorizado.
Em termos de quantidade a colher por hectare, varia de 20 a 30 toneladas, desde que respeitados todos os passos necessários para o seu bom processo de desenvolvimento até a fase de colheita.
O ananás tem propriedades digestivas e diuréticas e é um fruto com baixas calorias. Depois de estar maduro, deve ser consumido rapidamente, para não ficar estragado. É uma boa fonte de vitaminas A e B1 e também possui alguma vitamina C. Também é rico em cálcio, magnésio, potássio e ajuda a combater a hipertensão. O ananás é a fruta com maior comercialização enlatada, mas também é consumida fresco, sendo usado em bolos, gelados, sumos e refrigerantes, visto ser um fruto muito versátil.
Rigor na conservação
Quanto à conservação, de acordo com os especialistas, as frutas a serem removidas da planta, começam a respirar e transpirar como qualquer ser vivo. Dependendo da fruta, o tempo de duração normal, que varia de três a sete dias, pode ser prolongado, tendo em conta a temperatura em que a fruta é exposta.
A temperatura é responsável por aproximadamente 70 por cento de uma boa conservação, isto é, quanto maior for a temperatura, a fruta respira mais rápido, consome antes as suas reservas e morre mais rápido. Pelo contrário, com temperatura mais baixa o efeito é o inverso.
No caso do ananás, que é até das frutas com maior comercialização enlatada, mas que também é consumida fresca, sendo usado em bolos, gelados, sumos e refrigerantes, mostra-se como uma fruta muito versátil.
Algumas técnicas para aumentar o tempo de conservação são adoptadas e no caso do ananás, no nosso país, os comerciantes carregam entre capim (a que chamam de almofada) para impossibilitar que o produto toque directamente na chaparia da carroçaria, durante o percurso de carga, geralmente, longo, que expõe a fruta a temperatura ambiente e da própria viatura.
Os vendedores disseram à reportagem que, para longas distâncias, como é o caso do ananás comprado na província de Benguela, há que se encontrar, de igual modo, o melhor horário para realizar o trajecto de mais de 700 quilómetros, e sob uma forte variação climática. Há mesmo, segundo contam, quem chega a perder quase um quatro (1/4) da mercadoria por problemas com o acondicionamento do produto. O ananás, contam, é uma fruta que precisa de ser cuidada, pois ao terceiro dia do pós-colheita ela já começa a entrar em estado avançado de amdurecimento. Esse processo chega a ser prejudicial.
Quando em casa, os vendedores recomendam que a melhor forma de conservação passa pela colocação do ananás em refrigeração e já cortada/fatiada.
Ainda assim, também recomendam que o consumo ocorra não mais de 72 horas depois, pois acima desse tempo já se começa a exalar um cheiro ainda que de fruta, mas com certa tendência para gaseificação.
A província de Benguela em Angola é tida como a maior produtora de ananás e a localidade de Monte Belo, no município do Bocoio, a principal região produtora da fruta.
Em 2017, o município do Bocoio, na Província do Benguela, exportou 16 toneladas de ananás para a Namíbia e África do Sul.
A ausência de fábricas para a transformação da fruta em polpa ou sumos continuam a ser dos maiores desafios aos empresários da província e do país em geral.
O município do Bocoio está localizado a 102 quilómetros da cidade de Benguela e possui uma superfície de 5.612 quilómetros quadrados. Apresenta-se com quatro comunas, designadamente Monte-Belo, Chila, Cubal do Lumbo e Passe. Tem, segundo o censo de 2014, uma população estimada em 154.446 habitantes, que se dedicam maioritariamente à agricultura e à pastorícia.
O mesmo não se aplica no da batata-rena, por exemplo, que findo o prazo, a fruta acaba por se deteriorar e, aqui, a temperatura não é muito relevante. Também não é muito relevante a questão do clima para a laranja, que apesar da sua casca endurecida também pouco resiste à exposição a temperatura ambiente. Como conta uma vendedora do mercado do Km30, perdeu metade do camião de laranjas, que transportava do Bié, muito por força do mau acondicionamento e da alta exposição da temperatura em situação pouco recomendada.
Fonte: Jornal de Angola (29.09.22)